Você quer saber identificar precocemente os sintomas da Doença de Alzheimer? Esse artigo é para você!
E para falar sobre o assunto de hoje, gostaria de contar uma história…
CERTA VEZ, UMA PACIENTE me procurou em meu consultório. Ao entrar, notei que ela estava de mãos entrelaçadas as de um senhor de cabelos grisalhos. Seu nome, Maria. Um detalhe não passou despercebido, em sua ficha de cadastro constava que ela tinha 54 anos. Por uma fração de segundos, deliberei que Maria estivesse insegura em consultar um Neurologista pela primeira vez e, rapidamente, tratei de me levantar para cumprimenta-los. O senhor ao seu lado era Jorge, seu marido e fiel amigo há mais de 30 anos. Em tom amistoso, perguntei em que poderia lhes ajudar. Maria hesitou e, então, Jorge respondeu.
– Doutor, sinto que a memória da minha esposa não está tão boa como antigamente – disse ele.
Em seguida, referiu que seu déficit iniciara havia três anos, com piora lenta e progressiva. O primeiro fato que chamara a atenção da família foi quando Maria foi visitar a filha que morava em outro país. Depois de 15 dias que estavam lá, não sabia em que país estava. Foram a um conserto musical e, enquanto aguardavam na fila, perguntou 3 vezes o nome do artista que estava se apresentando.
Maria estava, também, ficando mais retraída, fato este que ia de encontro a sua personalidade, sempre muito carismática e falante.
Após ter se perdido em uma rua próxima à sua casa, deixou de realizar sua caminhada pela manhã, como sempre fizera há muitos anos. Até seu Rui, da banca de jornal, notou que Maria não comprava mais seu jornal.
Mais recentemente, convidaram um casal de amigos para um jantar e Maria faria sua famosa sobremesa de torta de maçã, mas Jorge precisou ajudá-la, pois estava com dificuldade para executar o passo-a-passo da receita.
Ao contrário do que a família supunha, Maria não apresentava sintomas depressivos, mas sim apatia. Na avaliação cognitiva, houve alterações de predomínio amnéstico, mas também em outros domínios cognitivos, como orientação e capacidade de resolver tarefas. Maria não se recordou em que ano estávamos e não foi capaz de abrir sua caixa de e-mail.
Após 2 anos de seguimento, Maria estava se isolando ainda mais, necessitava de ajuda para tomar os medicamentos e lembrar compromissos. Não conseguia mais sacar dinheiro e estava mais irritada, apresentando certa agressividade quando contrariada. Já não se lembrava mais de como era o vestido que usou no casamento há 32 anos atrás.
Após alguns meses, ao ver o marido, não o reconheceu e ficou visivelmente constrangida ao se deparar com um estranho entrando em seu quarto. Naquele dia, Jorge referiu ter chorado como nunca antes. “Senti ali, que estava, de fato, perdendo a pessoa que mais amei em minha vida”.
Maria tinha o diagnóstico de doença de Alzheimer.
O QUE É?
Este comovente relato ocorre, de maneira semelhante, em muitas famílias. A doença de Alzheimer (DA) é responsável por 70% das demências.
Apesar do termo ser estigmatizado, demência à luz da Neurologia é definida pela presença de declínio cognitivo persistente que interfere nas atividades sociais ou profissionais do indivíduo, afetando, pelo menos, 2 dos domínios cognitivos: memória, julgamento / senso crítico, habilidades visuoespaciais, alteração de linguagem ou alteração do comportamento.
A DA é uma doença degenerativa caracterizada pelo acúmulo cerebral da proteína beta-amiloide e da proteína tau. No início da doença, ocorre maior prejuízo da memória recente e, posteriormente, o comprometimento da memória episódica autobiográfica tardia.
UM OLHAR MAIS APROFUNDADO AO CASO…
No início, Maria apresentou dificuldade apenas para se lembrar o país que havia chegado há 15 dias e começou a se tornar um pouco repetitiva.
Após alguns meses, as alterações comportamentais começaram se tornar evidentes, ficando mais apática, menos comunicativa.
Com o passar do tempo, já apresentava perda da sua autonomia. Perdeu-se em um local amplamente conhecido por ela e não mais tinha a capacidade de perceber seus próprios déficits. Estas, aliás, foram as razões pelas quais Maria, em sua primeira consulta, chegou de mãos dadas às de seu marido e não ser capaz de responder o que lhe trouxera ao Neurologista. Jorge precisou “guia-la” durante toda a consulta.
Mais tardiamente, então, passou a apresentar prejuízo da memória tardia e já não se lembrava mais do vestido de noiva ou de seu marido, com quem compartilhou a vida por mais de 3 décadas.
O QUE FAZER?
Entre todas as possibilidades de tratamento que temos disponível, nada é superior ao acolhimento.
Costumo dizer, quando diagnosticamos um paciente com Doença de Alzheimer, diagnosticamos toda a família. Dos cuidadores aos familiares mais próximos, não há quem não sofra o impacto desta doença. Se não formos capazes de acolher essas famílias, estaremos errando como médicos e como seres humanos.
Muitas vezes, buscando a medicina baseada em evidências, nos esquecemos do essencial, o amor.
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